23 janeiro 2006

Laura Bacellar é escritora e organizou por bastante tempo um sarau só de mulheres no extinto grupo umas&outras. No final de 2005 deu uma oficina de escrita criativana Rato, direcionada exclusivamente para a criação de ficção com temática lésbica. Leia abaixo um de seus artigos a respeito da origem da palavra e da relutância das mulheres em usá-la para se definirem como mulheres que gostam de mulheres.

a palavra lésbica

muitas mulheres acham que a palavra lésbica soa mal, declarando-se
desconfortáveis com ela. de fato, o som ésb não é dos mais lindos, mas experimente dizer zoológico em voz alta. e que tal umbigo? analgésico?
e o azerbaijão, vizinho do uzbequistão e do tadjiquistão?

a língua portuguesa tem mesmo alguns sons pouco poéticos, mas não é por isto que dizemos parque dos animais, botão no meio da barriga ou ignoramos as repúblicas da antiga união soviética, não é verdade?

usamos as palavras no dia a dia pela sua precisão de sentido e associação de imagens que provocam. nesses quesitos, a palavra lésbica é muito melhor do que as alternativas.

veja por exemplo o termo entendida. ele tem a vantagem de ser brasileiro, criado por nossa cultura em lugar de traduzido de outra língua. mas nasceu
nos guetos das grandes cidades dos anos 70, quando ninguém ousava se definir abertamente e precisava de um código para se fazer "entender". entendida em quê? nos lugares recônditos onde as pessoas sem nome se reuniam, em secreta
resistência à ditadura das idéias e dos costumes.

é uma imagem de coragem – afinal, a ditadura existiu e perseguiu mesmo quem era diferente da norma – mas também lembra o subterfúgio, a preferência pelo esquivar-se a assumir uma identidade pública e natural.

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