23 agosto 2006

As sabedorias de Adélia

Não direi todos os clichês que já estamos cansados de ouvir sobre a mortalidade que ronda todos nós. São tantos, inúmeros, gastos, rotos... A morte é o assunto mais temido por todos, não é mesmo? Tantos já escreveram sobre ela, tantos já se debateram tentando apreendê-la para além dos clichês, mas quantos conseguiram de fato, essa proeza? É assunto árido, difícil e por isso, ler um livro que fala de morte de maneira delicada - como um afago – como uma conversa leve e amena é realmente uma grata surpresa, uma surpresa que se quer dividir com os outros. “Quero minha mãe”, da escritora Adélia Prado, é esse livro, é esta grata surpresa. Mais uma vez, Adélia vem poeticamente prosear sobre a vida e de maneira lírica – como nos conta já no título – fala de morte como quem nos conta sobre as novas flores do seu jardim. Olímpia é o nome da personagem que pressente a morte e que vai cavoucando lembranças como se buscasse em si mesma, as “sabedorias no almoxarifado” (como bem diz a autora) necessárias para enfrentar a proximidade da (terrível?) companhia. Estas sabedorias ela encontra na infância distante, mas sempre presente e na vida doméstica singela, mas cheia de significados profundos que fortalecem e ajudam a encarar a triste fase. O livro de Adélia é cheio de pequenas graças – sim, graças - e nos mostra que tudo depende da nossa visão. A morte pode ser encarada até com bom humor, como mais uma parte deste caminho sempre surpreendente que é a vida. “ De madrugada, mais assustada que o filhote e sem outra providência à mão, tomei vinte gotas de mulungu. Acordei boa, sol no céu e na alma (...)”: é assim que Adélia Prado nos fala das asperezas da morte. É dessa maneira lírica e tão bela, que ela nos leva para caminhar na inóspita paisagem da mortalidade (palavra terrível essa, não?). Como um companheiro de viagem sábio e sensível; como alguém que vivencia sua dor de forma corajosa e digna; é assim que Adélia nos leva a conhecer os terríveis meandros da morte, no entanto, não há o que temer; nesta estrada andaremos lépidos e fagueiros; porque bem acompanhados. Tens medo da morte? Então não deixe de contemplá-la pelos olhos de Adélia Prado.

Por Ana Claudia

Quero minha mãe
Adélia Prado
Record
R$ 24,90

da Adélia, leia também:

Os componentes da banda
romance lançado em 1984, reeditado em 2006.
139 págs.
Record
R$ 25,90

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